terça-feira, 26 de agosto de 2008

MONTANHAS

Depois da experiencia da Olimpíada um conto chinês para pensarmos sobre a cultura e a experiência desse povo. por Liezi, período dos Estados Combatentes (475-221 aC) recontado por Sérgio Capparelli
Meu avô tinha quase 90 anos e todo mundo dizia que ele era muito louco. E era. Mas eu gostava muito dele, principalmente pelas suas idéias malucas. Nessa época, ele disse que iria mudar de lugar as montanhas Taihang e Wangwu.
Claro, ninguém acreditou que ele fosse capaz de fazer isso.
No dia seguinte, ele saiu bem cedo para abrir caminho até o mercado de Hanying, como tinha prometido, para facilitar a venda de frutas e verduras.
- Essas montanhas ficam no caminho e atrapalham, pois tenho de dar voltas e voltas para chegar ao mercado. Aliás, não só eu, mas todo mundo.
Ele começou a encher o cesto com pedras. No início não dei importância, pois queria saber se ele tinha uma mágica, que resolvesse tudo de vez. Mas ele não tinha. Encheu dois cestos, passou nas alças dos cestos uma vara de bambu e equilibrou essa vara no ombro e na nuca, distribuindo o peso em cada extremidade.
Quando ele passou na frente de casa, vovó perguntou:
- E onde vai jogar as pedras? - No mar Bohai – ele respondeu.
Quando vovô voltou do Mar Bohai, decidi ajudá-lo. A gente quebrava as pedras, enchia com elas os cestos e íamos jogá-las no mar. O filho da nossa vizinha, que tinha nascido depois da morte do marido, veio nos ajudar e aceitamos.
Passamos a trabalhar de domingo a domingo, de primavera a primavera, e voltávamos para casa apenas uma vez por ano. Mesmo quem vivia criticando vovô, por causa de suas idéias malucas, se dispuseram a ajudar. Meus tios, por exemplo. Meus primos. Os vizinhos e os vizinhos desses vizinhos. Sim, diziam, essas montanhas têm de sair do lugar.
Um homem que vivia na beira do rio duvidou de que meu vô conseguisse mover as montanhas, tentando provar essa impossibilidade com muitos cálculos.
-Ah, me desculpe, mas não vai conseguir – disse ele para o meu vô - Você nem consegue levantar sozinho um saco de batata, quanto mais uma montanha.
Meu avô olhou pra ele, coçou a cabeça, olhou as duas montanhas, procurou o Mar Bohai lá longe, pareceu que ia concordar, mas não concordou:
-Mesmo se eu morrer, meus filhos continuam meu trabalho. E se eles morrerem, seus filhos, os filhos de seus filhos, os netos de seus filhos, os filhos dos filhos de seus netos. Já as montanhas não crescem mais. Por isso vamos continuar nosso trabalho.
Ilustração Wang Leu, Dinastia Ming, Montanha Hua Shan http://www.capparelli.com.br/contos.php Acesso em agosto de 2008.

2 comentários:

Luciene Barroso disse...

Adorei a história deste avó persistente e que acredita muito em si mesmo.
O Blog está muito bonito e interessante. Sempre que possível foi espiar. Bjs,

Adri disse...

Oi Lu,
Obrigada pelos elogios!Apareça sempre por aqui... Esse grupo me faz lembrar vocês da sala de leitura... Que saudades!
Beijos,
Adriana